Parecer: Âmbito do direito de habitação; conflitualidade com outros direitos |
Autoria: Maria João Mimoso, Doutora em Direito
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1ª – Tendo sido constituído um direito de habitação sobre o imóvel em causa, questionou-se se o mesmo abrangeria os demandados e sua respeitava família; 2ª – No artigo 1487º do C.C. são indicadas duas realidades de pessoas. Não são familiares e mesmo que a eles se equiparassem não poderiam integrar a previsão normativa do referido preceito, pois constituem um núcleo familiar autónomo; não são serviçais porque não evidenciam qualquer vínculo laboral; 3ª – Os demandados, até 1985, foram apenas possuidores precários, meros detentores da coisa (imóvel), porque exerciam sobre o imóvel poderes de facto, no interesse de outrem, sem intenção de os exercer em nome e proveito próprios; 4ª – Depois do óbito da proprietária do imóvel, os demandados passam a assumir a qualidade de possuidores em virtude da inversão do título, na modalidade de oposição dos detentores do direito contra aqueles em cujo nome possuíam; 5ª – O comportamento dos demandados exprime a vontade de possuir em seu próprio nome, praticando atos materiais na presença e com o conhecimento daqueles a quem se opõem; 6ª – Durante 27 anos, não foram praticados pelos demandantes quaisquer atos que possam ser entendidos como contrários ao comportamento dos demandados; 7ª – Pelo que o comportamento manifestado concretiza-se na posse para propriedade reunindo os elementos que a lei estipula; 8ª – Temos, assim a prática de atos materiais sobre o imóvel, corpus, que faz presumir a vontade dos possuidores atuarem como titulares do direito, animus; 9º - O direito de habitação não conflitua, juridicamente, com outros possíveis direitos ou estados de facto existentes sobre o mesmo objeto; 10º - A posse para direito de propriedade é um poder mais amplo do que a posse no exercício do direito de habitação, que em termos jurídicos se aproxima de uma "mera detenção"; 11ª – Existe, no entanto, uma situação de conflitualidade entre titulares da nua propriedade e os possuidores; 12ª – A posse durante um determinado lapso de tempo gera, como sabemos, usucapião; 13ª – A posse exercida pelos demandados, sendo pública, continua, pacifica, não titulada e de má-fé, é considerada posse boa para usucapião, desde que exercida durante, pelo menos, 20 anos; 14º - A situação descrita configura composse, pois os demandados, marido e mulher, exercem poderes sobre o imóvel há pelo menos 27 anos, pelo que se verificam os requisitos para a aquisição da propriedade por usucapião, situação que invocam na contestação; 15º - Caso assim não se entenda, haverá sempre posse para aquisição do direito de usufruto, por estarem reunidos os pressupostos para usucapião deste direito. |